A origem da festa do Pentecostes
remonta ao século IV antes de Cristo. Com início 50 dias depois da
festa da Páscoa, prolongava-se ao longo de 7 semanas. Originalmente
celebrava-se no campo mas, com o tempo, passou a ser celebrada no lugar do
culto, o Tempo, onde um feixe de trigo ou cevada era apresentado como oferta
a Deus, o doador da terra e a fonte de todo bem (Lv 23.11). Conhecida
primordialmente como Festa da Colheita ou da Segada (no hebraico hag
haqasir), por Festa das Semanas (no hebraico, hag xabu´ot), e ainda por Dia
das Primícias dos Frutos (no hebraico yom habikurim), adotou o nome
Pentecostes cuja etimologia advém da língua grega - significa "cinquenta
dias depois" -, cerca de 300 anos antes de Cristo, quando a cultura
helénica/grega dominava o mundo conhecido.
Além de ser uma ação de graças a
Deus pelos dons da terra, a festa do Pentecostes visava reforçar a
memória da libertação da escravidão no Egito e o cuidado com a
obediência às leis e preceitos divinos (Dt 16.12). Por isso, durante as
sete semanas em que a festa se estende, era recomendado estudar as sagradas
escrituras: a Torá. Além disso, procurava educar o povo para entregar o
excedente de sua produção agrícola a Deus, a fim de que essa oferta fosse partilhada
com os menos favorecidos (Lv 25.6-7, 21-22); e educar o povo para agradecer
a Deus pelo dom da terra que Ele nos concede para morar, cultivar e colher
os alimentos de que necessitamos.
É neste contexto festivo de gratidão
pelos dons concedidos por Deus que Lucas coloca o cumprimento da promessa de
Jesus quando diz que o Pai, em seu nome, nos enviará o Paráclito, o
Espírito Santo, para nos ensinar todas as coisas e nos recordar todo o que Ele
nos disse (João 14, 26).
O Espírito, dom de Deus, é apresentado
como “a força de Deus”, através de dois símbolos: o vento forte/impetuoso
e o fogo. São os símbolos da revelação de Deus no Monte Sinai,
quando Deus deu ao Povo a Lei e constituiu Israel como Povo de Deus (cf. Ex
19,16.18; Dt 4,36). Ao mesmo tempo o fogo manifesta-se aqui como línguas:
A língua é expressão da identidade cultural de um grupo humano, mas é também a
maneira de comunicar, de estabelecer laços duradouros entre as
pessoas, de criar comunidade. “Falar outras línguas” é criar relações, é
a possibilidade de superar o gueto, o egoísmo, a divisão, o racismo, a
marginalização… Aqui, temos o reverso de Babel (cf. Gn 11,1-9): lá,
os homens escolheram o orgulho, a ambição desmedida que conduziu à separação e
ao desentendimento; aqui, regressa-se à unidade, à relação, à construção de
uma comunidade capaz do diálogo, do entendimento, da comunicação. É o
surgimento de uma humanidade unida, não pela força, mas pela partilha da
mesma experiência interior, fonte de liberdade, de comunhão, de amor. A
comunidade messiânica é a comunidade onde a ação de Deus (pelo Espírito)
modifica profundamente as relações humanas, levando à partilha, à relação, ao
amor.
Representantes de todo o mundo antigo ouvem os discípulos de Jesus falar na sua
língua-materna, língua-mãe: a mesma língua que existe entre a mãe e o
seu bebé, a linguagem da confiança, da ternura… a linguagem do amor, que
mais do que ser falada pela boca e ouvida pelos ouvidos é falada, escutada e
entendida de coração para coração.
Essa língua-mãe, efeito muito
admirável do Espírito Santo, é a língua que fala a cada filho que a escuta,
fazendo-os a todos irmãos. Não há mais barreiras intransponíveis, não há
fontes de desentendimento como em Babel: todos se podem entender se
deixarem-se ser guiados pelo Espírito Santo. E todos têm em si a capacidade
de compreender a língua do Espírito Santo, linguagem da Trindade que nos criou,
tal como todos conseguem entender a língua da mãe que nos cuidou!
Sem deixarem e as suas diferenças
culturais e linguística, todos os povos escutarão a proposta de Jesus e
serão capazes de a entender, fruto do Espírito Santo. Terão a possibilidade de integrar
a comunidade da salvação, onde se fala a mesma língua e onde todos poderão
experimentar esse amor e essa comunhão. A Igreja surge assim como a
anti-Babel. Se lá os homens se viraram costas, aqui se reúnem novamente num
só povo: o novo Povo de Deus que, apesar das diferenças culturais,
inspirados pelo Espirito Santo, são capazes de se compreenderem e viverem
como irmãos.
O Espírito Santo, dom de Deus para a
humanidade, reúne na Igreja os homens dispersos por todos os lugares,
línguas e culturas do mundo num só povo onde os “carismas” (dons
especiais concedidos pelo Espírito) de cada um são ordenados para proveito
de todos, onde todos vivem como irmãos sem que uns sejam superiores a
outros mas todos igualmente valiosos e com o mesmo direito e obrigação
de trabalhar pelo bem-comum, de escancarar as portas da casa, de se
soltarem das amarras do medo e irem pelo mundo propagar o fogo do Espírito
Santo pelo anúncio das maravilhas de Deus. Também nós somos enviados
com a força do Espírito Santo a ser testemunhas de Cristo em todos os tempos
e lugares!
Que o Espírito Santo nos dê o dom da sabedoria
sobre as coisas de Deus, o dom da inteligência para as compreender, o
dom do conselho para as viver, o dom da fortaleza para perseverar
no caminho da santidade, o dom do conhecimento de Jesus Cristo como
Filho de Deus, nosso Mestre e Senhor, o dom da piedade para fazer d´Ele
o centro da nossa vida, o dom do temor para rejeitar todo o que é
indigno dos filhos de Deus. Vinde, ó santo Espírito, vinde, Amor ardente,
acendei na terra vossa luz fulgente.
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