Depois da multidão que seguia Jesus o ter procurado e
esperado em lugar deserto, Jesus sentiu compaixão e curou os seus doentes. Mas
ao contrário do que aconselharam os seus discípulos, Jesus não os despediu para
que eles fossem comprar comida. Jesus convidou os discípulos a darem eles
mesmos comer à multidão. Mas, não havendo mais que cinco pães e dois peixes,
Jesus olhou os céus e deu graças e partindo os pães que distribuiu pelos
discípulos, para que estes os distribuíssem pela multidão, alimentou cinco mil
homens sem contar mulheres e crianças. Todos comeram e ficaram saciados tendo
sobrado doze cestos cheios.
A seguir ao êxito do milagre da multidão saciada pela multiplicação
do pão, o Evangelho de Mateus coloca-nos hoje diante de um acontecimento que
faz arrefecer o entusiasmo excessivo dos discípulos.
A travessia do mar ou lago de Tiberíades ou da Genesaré, lago
de água doce com 21 quilómetros de comprimento e 12 de largura, enquadra o
ambiente onde, para a teologia judaica, habitavam os monstros, os demónios e
todas as forças que se opunham à vida e à felicidade do homem.
O Evangelho segundo São Mateus, que nos é dado escutar neste
ciclo litúrgico do ano A, escrito durante a década de 80, destina-se a uma
comunidade cristã que já esqueceu o seu entusiasmo inicial por Jesus e pelo seu
Evangelho e que vive uma fé cómoda, instalada, pouco exigente. Todavia o
ambiente é já de turbulência, contrariedade e perseguição.
De certo modo, podemos dizer que esse mesmo ambiente é vivido
hoje: a nossa época é uma época em que a fé se resume a um sentimento
superficial pouco comprometido e entusiasta. Serve para justificar festas e
procissões, encontros de milhares de jovens, romagens a pé a santuários
distantes. Mas em quê compromete as nossas vidas? Em que é que a nossa fé é transformadora
do mundo? O nosso amor e fidelidade a Jesus Cristo resiste aos momentos de
confusão e tribulação ou é apenas uma neblina passageira dos momentos fáceis
que se esvai aos primeiros raios de dificuldade?
A nossa Igreja é de todos, todos, todos. O convite de Jesus é
para todos, todos, todos. E o Céu(?), será uma realidade para preguiçosos,
pecadores obstinados, cristãos apenas de dia de festa pouco comprometidos com
as coisas de Deus?
Não basta amar Cristo e ser Igreja quando o mar está calmo! É
preciso amar Cristo e ser fiel na sua Igreja também quando a hostilidade do
mundo, os projetos e mentalidades mundanas, a oposição e resistência do mundo
ao evangelho de Jesus batem continuamente contra a o barco em que viajam os
discípulos, esse barco que é a Igreja.
Irmãos e irmãs, quando nos sentirmos perdidos, sozinhos,
abandonados, desanimados, desiludidos, incapazes de enfrentar as tempestades
que as forças da morte, do pecado e da opressão que fustigam o mundo e a Igreja
não desistamos de rezar como Pedro: “Salva-me, Senhor!”.
Pedro dá-nos um belo exemplo: o de não desistir de Jesus e o
de crescer na fé. Duvidou da presença de Jesus (“É um fantasma”), abriu o
coração à possibilidade de ser Jesus (“Senhor, se és tu, manda-me ir ao teu
encontro”), confiou em Jesus (“caminhou sobre as águas para ir ter com Jesus”)
e, quando de novo a sua fé vacilou e teve medo, não deixou de voltar a rezar devotamente
(“Salva-me, Senhor!”). Pedro e os outros discípulos descobrem neste episódio
que no mar turbulento a segurança e a bonança só chegam se Jesus também for na
barca: a Igreja só pode subsistir se Jesus estiver no centro.
Que por intercessão de Nossa Senhora confiemos que o Deus “que
está acima de todas as coisas” está também próximo de nós não só nos momentos
de êxito mas também nos momentos de tribulação, não só na voz dos trovões e
relâmpagos (com que se revelou a Moisés) mas também brisa ligeira (com que se
revelou a Elias). Com o exemplo e intercessão de Nossa Senhora a nossa fé em
seu filho Jesus Cristo seja fortalecida (“Tu és verdadeiramente o Filho de Deus”),
comprometida com as coisas de Deus, desejosa das realidades dos Céus e
transformadora das realidades terrenas.
Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo - para sempre seja
louvado no céu e na terra com sua Mãe, Maria santíssima.
(Padre João Miguel Pereira)
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