As lágrimas falam-nos...

Eu choro. Vós chorais. Porque choro eu? Porque chorais vós? Porque chora, cada um de nós?

As lágrimas são o maior grito da alma. Um grito que tantas vezes não é escutado pelos outros, mas que sempre é escutado por Deus. Quem chora pode não estar na presença dos outros, mas sempre está diante de Deus.

As lágrimas são resultado de um coração que se rasga, ferido pela lança dos sentidos e dos sentimentos, e que deixa jorrar para fora de si a linguagem da sua comoção.

As lágrimas falam de dor, de saudade, de arrependimento, de solidão, de impotência, de incompreensão, de doença, de incompletude… As lágrimas falam de tanto e por tantas vezes do sofrimento, mas, mesmo que não ouçamos, conseguem também falar de alegria e felicidade.

As lágrimas são uma linguagem sincera que felizmente poucos conseguem mascarar. São poucos os que conseguem ordenar ao coração para chorar. São poucos os que conseguem fazer o coração que chora calar. E que assim seja. É uma bênção ser livre para chorar. É um dom chorar na sinceridade.

As lágrimas são também um grito de fome da alma insaciada. A insaciedade da alma que foi criada por Deus para ser feliz e não para sofrer, criada para a vida e não para morrer, criada para a eternidade e que, por isso, não se pode contentar com a finitude desta vida.

As nossas lágrimas são, por isso, o clamar, que mesmo por vezes inconsciente, grita o desejo que temos de plenitude, de saúde, de felicidade, de infinito… de eternidade.

As lágrimas, que correm do coração e se mostram pelos olhos, falam do desejo que temos no íntimo de nós de ver as promessas de Deus. Falam do desejo de que a morte e o pecado desapareçam, que a doença tenha remédio, que deixe de haver miséria, que a paz vença a violência, que a saudade seja sanada pela presença, que a justiça governe todos os povos, que a vida verdadeira ressuscite cada sepultado, que cada inimigo se torne um irmão, que sejamos reunidos no coração de Deus, que finalmente possamos encontrar Aquele que nos criou por amor.

As lágrimas que hoje chorais, na partida daquela alma a quem amais, são o gritar do desejo inscrito, por Deus, em vós, em nós… o desejo que não podemos calar nem ainda saciar… o desejo do Céu.

As lágrimas que agora choramos são o grito da nossa esperança que deseja conhecer Deus, são a nossa aspiração por reencontrar os nossos… As lágrimas que choramos são os nossos corações cheios de saudade, livres de toda a falsa vaidade, reconhecidos da impotência e da fragilidade, de quem não quer afastar-se de quem ama, de quem não quer afastar-se de quem nos cuidou e deu amor, nos curou feridas e aliviou a dor, nos fez sorrir e antecipar, no meio da fugacidade da temporalidade, o que nos está reservado na eternidade.

Choremos e escutemos atentamente o que as lágrimas nos dizem. Elas falam-nos do lugar onde elas não mais terão lugar: as lágrimas falam-nos do Paraíso, da morada santa de Deus, onde se enxugam todas as lágrimas e os nossos olhos verão a luz eterna do Senhor… onde vivem aqueles que amamos e viveram de amor e no amor.

As lágrimas falam-nos da nossa insaciedade que só Deus pode saciar.

João Miguel Pereira, 2025



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