Quantas lições de santidade Deus já me deu enquanto confessor...

Enquanto estudante de Teologia, de Sacramentos, de Ética, de Moral, de Espiritualidade, de Psicologia e Acompanhamento das Consciências, sempre me fascinaram os fundamentos do Sacramento da Reconciliação, o seu importante papel na vida espiritual dos cristãos e a sua meta ambiciosa, porque bela e plena de alegria: a santidade.

Uma das lições que melhor retive e mais me fascinou, transversal a todas essas áreas do saber, veio-me, por mais estranho que possa parecer, das aulas de Direito Canónico: “entrar na consciência de alguém é um privilégio muito grande que exige grande dedicação e temor, implica caminhar com ‘passinhos de lá’, pois qualquer movimento brusco pode provocar graves consequências na vida daquela pessoa que nos deixou entrar no seu ‘espaço mais sagrado’”.

Ao mesmo tempo, desanimava-me deparar-me com o paradigma atual dos cristãos diante deste sacramento (que não me parece muito diferente daquele sobre os restantes seis). A pouca frequência nos sacramentos, a desvalorização da sua centralidade na vida das pessoas, e a imagem distorcida e negativa que corre nas cabeças de uma grande maioria torna-se evidente, de modo peculiar, quando se fala do sacramento da Confissão, Penitência ou Reconciliação. E, se me dói que discorra a ideia de que esta “é uma forma de os padres saberem o que vai na cabeça das pessoas”; “é uma forma dos padres controlarem os féis”; “é uma forma de os padres saberem quais são os ‘podres’ de cada um”; e a perda total da consciência de pecado ou a sua sobrevalorização culminando na desvalorização da Graça que continua a produzir frutos de santidade na vida dos ‘pobres pecadores’; doí-me ainda mais a atitude daqueles que, por obrigação do seu estado ou percurso formativo, continuam a tratar este sacramento com uma leviandade tal que em nada contribui para o crescimento espiritual da comunidade cristã.

Como “penitente”, isto é, como cristão que se abeirou de um sacerdote enquanto ministro de Cristo para se confessar pecador e pedir o perdão de Deus, tive dos ápices mais felizes e infelizes da minha caminhada espiritual e vocacional. Fui tratado com arrogância e desprezo, despachado a contrarrelógio e com completa desatenção. Mas também tive momentos de sentir-me intimamente tocado pela misericórdia do Deus próximo, de escutar verdadeiros conselhos espirituais de sacerdotes instrumentos do Espírito Santo, de alívio da dor e da mágoa do arrependimento, curada com o óleo de uma palavra compassiva inspirada nos gestos e ensinamentos de Jesus Cristo.

Como confessor, procuro sempre seguir os melhores exemplos que recebo cada vez que sou eu o penitente. É verdade que nem sempre terei sido digno representante de Cristo, lamento… mas estou convicto de que me tenho esforçado por fazer o que me compete, deixando humilde e confiadamente a última palavra nas mãos do único protagonista, o Espírito Santo, enviado pelo Pai para perdoar os pecados e fazer crescer a santidade.

Como seminarista, várias vezes me custou acreditar nos testemunhos de sacerdotes experientes quando falavam sobre a “beleza”, o “privilégio” e a “graça” de poder escutar em segredo de confissão e “distribuir a misericórdia de Deus”. Achava esses testemunhos uma loucura ou uma utopia diante daquilo que me parecia a realidade vigente.

Hoje, como sacerdote, perto de fazer apenas meio ano de ordenação e consagração presbiteral, e depois de escutar em confissão talvez perto de meia centena de pessoas, algumas de forma regular, consigo entender o que esses sacerdotes queriam dizer. Sim, eram testemunhos verdadeiros… agora os entendo. Em apenas meio ano atendi em confissão pessoas a quem diante de Deus não tenho medo de dizer “olha, Senhor, eis aqui uma alma santa que te pertence”; confissões em que terminei a chorar as lágrimas de olhos que reconhecem quantas maravilhas e graças espirituais Deus vai fazendo brotar nas vidas de homens e mulheres que apresar das cinzas dos infortúnios e sofrimentos da vida continuam incansavelmente a busca-Lo e a lutar para se santificarem. Quantas lições de santidade Deus já me deu enquanto confessor e seu ministro, ainda que em tão pouco tempo.

É um dom muito grande testemunhar que há gente que humildemente reconhece os seus pecados, sem obsessão escrupulosa, mas que se sabendo pecadora, se arrepende, confia na misericórdia de Deus, se dispõe com empenho a remendar o bem ofendido e procura cada dia corresponde-Lhe mais e melhor numa relação dialógica de amor.

E enganem-se aqueles que julgam que o que o sacerdote ouve em confissão lhe traz alguma outra utilidade além, eventualmente, desta única que é contribuir também para sua própria santificação ao mesmo tempo que se deixa ser instrumento nas mãos de Deus para a santificação dos irmãos.




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